Aquiles e a tartaruga lusitana, de Alberto Manguel

 


O vagaroso tempo português talvez revele afinal, durante a pandemia, uma virtude desconhecida: a virtude da reflexão, a lenta ponderação do milagre de estarmos vivos, apesar de tudo

TEXTO ALBERTO MANGUEL




K

e cada vez que me mudo para uma nova cidade (e já vivi em muitas) tento compreender aquilo que me parecem ser os seus atributos específicos, os traços que nos primeiros dias, às vezes nas primeiras horas, surgem como impressões imediatas. O desassossego de Nova Iorque, a seriedade de Milão, a melancolia de Buenos Aires, a exuberância de Paris, a arrogância de Londres foram alguns dos aspetos que descobri pouco depois de me fixar nestes lugares que só conhecia dos livros. Aos poucos, estas características estridentes das minhas caricaturas geográficas foram desaparecendo, ou matizaram-se, e acabaram por ser substituídas por um imaginário mais complexo e profundo. Quando conheço uma pessoa nova, o processo é semelhante: o tom de voz, a maneira de vestir, o desenho do rosto vão dando lugar a considerações menos impulsivas acerca dos pensamentos e emoções dessa pessoa. Os dois cenários coexistem, mas um deles transforma-se na sombra do outro.

No Barroco, esta coexistência de características — as evidentes e as ocultas — era um dispositivo artístico. A poesia, a arquitetura e as artes traziam para primeiro plano a riqueza equívoca do universo visível, enterrando deliberadamente as ideias nucleares em torno das quais se entreteciam as volutas e os ornamentos. A duplicidade tornou-se lugar-comum em todas as representações artísticas. Enquanto símbolo de vanitas, ou do engano inerente às coisas do mundo, à carne e ao demónio, a natureza dúplice ou talvez múltipla de tudo permitia que os artistas e os poetas olhassem para várias facetas de uma vez só e as revelassem, tal como acontece nas imagens esculpidas nas fachadas das catedrais ou representadas nos objetos do quotidiano, mostrando, por exemplo, uma bela mulher de um lado e do outro um cadáver a apodrecer. No seu comentário à tradição iconográfica da vanitas em Portugal, Ana Hatherly, numa conferência na Delegação da Fundação Gulbenkian em Paris, em 1989, citou um poema do século XVII, da autoria de Eusébio de Matos, que elogiava a beleza de uma mulher enquanto constituinte de um dos lados da temática. Bernardo Vieira, seu colega e talvez seu amigo, colocou um espelho diante do poema de Matos, acompanhando os seus versos mas descrevendo, ao invés da beleza do corpo vivo, a degradação e a decadência que atingem todos os corpos. Em 1651, o padre António Vieira, irmão de Bernardo, afirmou com clareza num sermão que “o espelho é um demónio mudo”.

Acatando o aviso do padre António Vieira, aprendi a desconfiar das impressões transmitidas pelo “demónio mudo” de uma cidade aquando da primeira visita e a esperar até que outras perspetivas, outros encontros, outras incursões me deixem ver uma cartografia diferente desse lugar. Por estes dias, confinado à minha casa na freguesia da Misericórdia, não posso explorar a cidade física; apenas me é permitida uma outra exploração, menos tangível. Os guias de Lisboa que conheci muito antes de aqui chegar descreviam uma cidade de há muito tempo, que talvez um dia tivesse sido assim. “Afirma Pereira”, de Antonio Tabucchi, “O Ano da Morte de Ricardo Reis”, de José Saramago, “El Rinoceronte y el Poeta”, de Miguel Barrero, “Lisboa, Um Melodrama”, de Leopoldo Brizuela, “Het volgende verhaal” (“A História Seguinte”), de Cees Nooteboom, compunham um puzzle cheio de peças educativas e esclarecedoras. Mas as características que aí aparecem, sendo verosímeis nas páginas que li avidamente, já não são as da Lisboa atual — a minha Lisboa, agora desprovida de turistas, com as lojas fechadas, os restaurantes encerrados, os bares silenciosos, os elétricos quase vazios. A Lisboa que se espreguiça à minha janela como um gato sonolento não é a cidade encharcada de Saramago nem a cidade inquieta de Tabucchi. A atmosfera é outra.




E, contudo, algumas coisas estão iguais. O inevitável Pessoa, tentando definir um traço distintivo dos portugueses, imaginou que pudesse tratar-se de um certo provincianismo. Em 1928, escreveu assim: “Se, por um daqueles artifícios cómodos, pelos quais simplificamos a realidade com o fito de a compreender, quisermos resumir numa síndroma o mal superior português, diremos que esse mal consiste no provincianismo. O facto é triste, mas não nos é peculiar. De igual doença enfermam muitos outros países, que se consideram civilizantes com orgulho e erro.” Mas Pessoa também explicou que uma das características essenciais do provincianismo português é, “na esfera mental superior, a incapacidade de ironia”. Este aspeto, escolhido por Pessoa há quase um século, parece-me ser verdadeiro ainda hoje. Se os portugueses fossem cultores do olhar irónico, encontrariam ampla matéria de estudo na sua confusa e tentacular burocracia! As propostas de um Jonathan Swift relativas aos funcionários da Alfândega seriam não menos modestas! E que Cândidos comporia um Voltaire a propósito da incapacidade portuguesa para cuidar dos seus muitos jardins públicos, tão desalinhados! Quantos castelos inalcançáveis construiria um Kafka acerca dos intermináveis atrasos dos serviços postais antes de chegarem ao desejado destino! É verdade que há lampejos de ironia em Eça de Queirós, Saramago, Gonçalo M. Tavares e Teresa Veiga. Mas não chegam para criar a atmosfera irónica dominante com que os leitores tantas vezes se deparam nas literaturas inglesa ou francesa. Talvez uma delicada cortesia, pelo menos a que se dirige a estrangeiros como eu e que insiste em tratar toda a gente por “Excelentíssimo”, impeça os portugueses de serem ironicamente ofensivos. A ironia não é cortês. Nunca conheci um português que falasse sobre a ironia do facto de o grande prato nacional — o bacalhau, preparado de 365 maneiras diferentes, uma para cada dia do ano — ter de ser importado da Terra Nova para depois ser salgado com sal de Aveiro. Nenhum dos meus amigos portugueses descortina a ironia de, numa sociedade declaradamente igualitária, ser possível morar na esquina do Poço dos Negros com a Travessa do Judeu. Nenhum dos escritores portugueses que conheço se atreveria a aconselhar um jovem aspirante a escritor como o fez Dorothy Parker: “Se algum dos seus jovens amigos almejar tornar-se escritor, o segundo maior favor que pode prestar-lhe é oferecer-lhe um exemplar de ‘The Elements of Style’ [“Os Elementos do Estilo”]; o maior favor é, claro, matá-lo já, enquanto ele ainda é feliz.” Quando uma amiga portuguesa me disse que no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, Portugal é conhecido como “a tartaruga”, respondi que ela não tinha percebido a ironia da alcunha e lembrei-lhe que Aquiles tinha a tartaruga em grande conta, depois da célebre corrida. Com a devida vénia a Pessoa, eu diria que é reconfortante viver numa sociedade que evita a ironia, porque, ao fazê-lo, evita também infligir sofrimento gratuito. Na época de grandes padecimentos que atravessamos, isto é uma coisa boa.

Claro que há muitas outras características que tenho vindo a descobrir na minha nova terra adotiva, características escondidas e profundamente interligadas, como as raízes de certas árvores que parecem estar isoladas à superfície mas que se ligam umas às outras através de um emaranhado de fios subterrâneos. Por exemplo, o facto de os portugueses evitarem a ironia — o que não significa que lhes falte sentido de humor — confere à sua fala, segundo a minha experiência, uma certa sinceridade, uma certa consideração respeitosa que conduz a conversas contemplativas. Os portugueses não procuram sobrepor-se ao outro quando trocam opiniões, pelo menos da maneira que fazem os argentinos ou os nova-iorquinos. Há um ritmo lento na linguagem (refiro-me ao português de Portugal e não ao do Brasil) que acolhe generosamente as pausas do falante para refletir e abre espaço ao desenvolvimento de ideias no interlocutor. Uma conversa em português é muito mais demorada do que a mesma conversa em francês ou em italiano, nas quais o fluxo avança de interrupção em interrupção. Os portugueses não se atravessam quando outra pessoa está a falar: aguardam educadamente que a frase seja concluída. Eu, que tenho o hábito abominável de interromper, reconheço nisto, simplesmente, boas maneiras.

Este ritmo sem pressas infiltra-se em tudo, em Portugal. Em “Heróstrato e a Busca da Imortalidade”, Pessoa queixa-se: “A lentidão da nossa vida é tão grande que não nos consideramos velhos aos 40 anos. A velocidade dos veículos retirou a velocidade às nossas almas. Vivemos muito devagar, e é por isso que nos aborrecemos tão facilmente. A vida tornou-se para nós uma zona rural. Não trabalhamos o suficiente e fingimos trabalhar demasiado. Movemo-nos muito rapidamente de um ponto onde nada se faz para outro onde não há nada que fazer e chamamos a isto a pressa febril da vida moderna. Não é a febre da pressa, mas sim a pressa da febre. A vida moderna é um lazer agitado, uma fuga ao movimento ordenado por meio da agitação.” Creio que aquilo que Pessoa considerou negativo pode ser visto como positivo. Este voo lento, esta “pressa da febre” que em tantos países se julga uma falha que deve ser violentamente corrigida, é de modo geral aceite em Portugal como salutar.




A impaciente exasperação inglesa da frase “Despache-se! Não tenho o dia todo!”, ou a irónica réplica “O Natal também há de chegar!”, ou a exigência grosseira de “Quero isto para ontem!” não são facilmente traduzíveis para português. Mesmo a visão pessimista do futuro descrita por Eduardo Lourenço como “uma espécie de apocalipse lento” aplaca a derradeira catástrofe com um adjetivo muito português. “Os pobres chegam tarde à mesa dos ricos”, afirmou Lourenço ao referir-se à integração tardia de Portugal na Europa contemporânea. “Comparando, todavia, com outros países de iguais tradições, estamos sentados à mesa dos ricos, talvez a um cantinho da mesa.” Mas será que isto é mau? A imagem de alguém que está num canto da mesa é uma constante nas conversas que tenho sobre Portugal com os meus amigos portugueses. “Portugal é uma ervilha quando comparado com a maçã de Nova Iorque”, comentou um deles. Não se deixou impressio­nar quando lhe respondi que, se fosse uma ervilha, seria a ervilha que a princesa consegue sentir debaixo de cem colchões. Penso que talvez exista algum orgulho modesto quando nos consideramos a nós mesmos participantes ativos mas simultaneamente pequenos.

A fase do confinamento que estamos a atravessar, em que Portugal chegou ao infortúnio de ser estatisticamente o país com mais casos e mortes por covid-19 no mundo, não beneficia em nada da lentidão na tomada de decisões políticas claras, das hesitações irrazoáveis acerca de procedimentos práticos, da inação que deixou os hospitais a abarrotar e do atraso na distribuição das vacinas. No entanto, do ponto de vista existencial (se é que a existência ainda está em jogo), este confinamento pode beneficiar da qualidade portuguesa modesta, lenta, elegíaca e contemplativa que nos permite refletir sobre a nossa existência temporal enquanto estamos espacialmente confinados. A língua inglesa aglomera ambas as condições num único verbo, muito breve: to be. Mas em português o enigma de Hamlet tem de ser enunciado de forma bem mais específica. Enquanto as semanas passam e os dias se fundem, monótonos, uns nos outros, enquanto a geografia das nossas celas prisionais convoca repetitivas “viagens à volta do meu quarto”, pelo menos em Portugal podemos assumir em consciência a nossa condição de ‘ser’ no tempo, existindo lentamente, ao mesmo tempo que damos por nós limitados a ‘estar’ num único sítio. Talvez seja ainda cedo para vermos os ecos do tempo presente na ficção ou na poesia, ainda que, em maio do ano passado, 46 escritores portugueses tenham colaborado num livro eletrónico acerca do confinamento, cada um escrevendo um capítulo de não mais do que três mil palavras. Isto poderá indicar como foi curto, até agora, o tempo da pandemia, que ainda só tem 12 meses, se compararmos com a epidemia de gripe no começo do século XX ou com as duas Grandes Guerras. Ainda estamos no início do Segundo Dilúvio Universal.

O vagar é uma qualidade essencial para a leitura. No entanto, e apesar da elevada taxa de alfabetização (95,4%), os portugueses não são leitores vorazes. Em 2019, a maioria dos mais de sete mil estudantes que participaram num inquérito admitiu ter lido menos de três livros ao longo do ano anterior; 21% afirmaram que, no mesmo período, não haviam lido nenhum. Simultaneamente, a maior parte dos portugueses dirá que a poesia é importante na sua vida, ainda que as vendas dos livros de poesia sejam tristemente escassas. Talvez isto aconteça porque a poesia, em Portugal, é tomada como qualidade inerente à identidade nacional, não tanto como atividade de leitura em si mesma, mas antes como ‘saudoso’ estado de espírito. Talvez porque todos os poemas passem a ser elegíacos com o curso do tempo, e porque as elegias pedem uma cadência em passo lento, os portugueses sintam que esta qualidade poética se ajusta à sua ideia comum de ‘saudade’, ideia que por sua vez se torna, de acordo com Eduardo Lourenço, “expressão do excesso de amor em relação a tudo o que merece ser amado”. É comovente e significativo que as primeiras palavras — preservadas numa crónica do século XII — de uma língua galega estranhamente próxima do português moderno sejam os lamentos de Afonso VI, avô do primeiro rei de Portugal, depois de perder o filho na Batalha de Uclés, em 1108: “Ay meu fillo! ay meu fillo, alegria do meu coraçon e lume de meus ollos, solaz de mia velhece! Ay meu espello en que me soia veer e con que tomaba gran prazer! Ay meu heredeiro mor. Cavaleiros u me lo leixastes? Dade-me o meu fillo, Condes!” Não estou a ser irónico.




Evitar a ironia, sentir-se orgulhosamente pequeno e agir com deliberado comedimento são qualidades raras e (para um estrangeiro) desconcertantes. A burocracia, que em quase todos os países é somente pretexto para subornos e privilégios, em Portugal não é mais do que uma corrida de obstáculos consentida, uma corrida muito lenta, mais acidentada do que veloz. As regras, quando conseguimos compreendê-las e respeitá-las, são feitas para atrasar o curso de uma ação, seja para obter um documento oficial, arranjar um carpinteiro que construa estantes ou, Deus nos ajude, desalfandegar algum artigo. Mesmo assim, as coisas acabam por acontecer, presumo que devido a um intrínseco sentido de honra, de obrigação sine die de se manter a palavra dada: decorridos vários meses, e depois de perdida a esperança, alguém simpático, sem pedir desculpas mas com um sorriso gentil, diz-nos que o documento está finalmente pronto, vemos as estantes nas paredes, o artigo da Alfândega é devolvido ao remetente ou, se as estrelas quiserem, chega por fim às nossas mãos, mais velho e (espero) mais sábio devido à experiência. Para tudo isto é preciso paciência. Se calhar, a paciente Griselda de Boccaccio e Chaucer era afinal portuguesa.

A paciência é uma virtude (se de facto ‘for’ uma virtude) interligada com a ideia de tempo. José Tolentino Mendonça afirmou que vivemos todos “sob a ditadura do tempo cronológico”: somos literalmente devorados por Cronos, o titã que engoliu os próprios filhos. Em Portugal, Cronos mastiga com deliberada moderação, refletindo entre cada garfada. Este ritmo descontraído traz cor à vida quotidiana. O bacalhau — que, segundo W. H. Auden, quando está rijo sabe a unhas dos pés e quando é mais macio sabe à pele da planta dos pés — tem de ser demolhado durante dois dias antes de propriamente cozinhado. Atravessar Lisboa de elétrico é uma experiência magnífica, a não ser que estejamos com pressa para um compromisso. Subir e descer as ruas íngremes é excelente para o metabolismo, mas não podemos acelerar o passo sem arriscarmos sofrer um enfarte. A marcha da História de Portugal avançou a este mesmo ritmo. Em 1871, Antero de Quental salientou que “a decadência dos povos da Península nos três últimos séculos é um dos factos mais incontestáveis, mais evidentes de nossa história”. Trezentos anos é um tempo bastante longo para a decadência se instalar: em Berlim e em Paris, a decadência ocorreu num ano ou dois, algures a meio dos anos 30; o declínio do império americano estendeu-se somente pelos quatro negros anos do regime de Donald Trump. Quental queixou-se de que a intrínseca lentidão de Portugal atrasou a chegada de mudanças culturais revolucionárias, mas um século mais tarde essa lentidão acabou por ser benéfica, atrasando também a chegada de tendências nocivas. Depois da guerra, vários movimentos de extrema-direita tornaram-se estridentes em França, em Itália, na Hungria e em vários outros países europeus, nas décadas de 80 e 90; em Portugal, quase ninguém ouvira falar de André Ventura antes da fundação do seu partido, em 2019. O movimento revisionista que defende a destruição de monumentos de homenagem a figuras históricas controversas alcançou popularidade nos Estados Unidos logo em 2017, quando foram vandalizadas estátuas de Cristóvão Colombo em Baltimore e em Nova Iorque; as incitações à remoção dos monumentos dedicados ao padre António Vieira — justificadas pelas suas opiniões unicamente acerca do tratamento dado aos nativos e não aos escravos africanos — só começaram a fazer-se ouvir em Portugal em junho do ano passado. E a censura na Academia norte-americana, que obriga os professores universitários de Literatura a alertarem os alunos caso o texto a estudar possa ofendê-los (como a violação de Lucrécia, o incesto de Édipo, o retrato dos africanos feito por Camões e por Conrad), ainda não chegou às salas de aulas portuguesas. O vagar é por vezes uma bênção.

Por toda a parte e em todas as épocas somos confrontados com uma divindade voraz que nos encurta os dias e nos distende as noites, mas não só. O cardeal Tolentino acrescenta que “os inconformados gregos, a par de Cronos, tinham uma outra conceção do tempo, uma espécie de contabilização vertiginosa, uma inalterável linha contínua que nos aprisiona na sua teia”. Esta dupla identidade do tempo pode ser experimentada por meio da voragem de Cronos — como nas horas inscritas em relógios de sol antigos, “omnes vulnerant, ultima necat” (“todas ferem, a última mata”) — mas também como um período produtivo e recetivo: “o tempo de”, “o tempo para”. Tolentino lembra-nos ainda que, nestes dias de clausura e erosão contínua, a parábola de Cristo sobre os lírios do campo é de elevada pertinência. O vagaroso tempo português, que vem atravessando os séculos desde a odisseia mítica da fundação do país e que chega até ao presente, talvez revele afinal, durante a pandemia, uma virtude desconhecida: a virtude da reflexão, a lenta ponderação do milagre de estarmos vivos, apesar de tudo. Não nos foi prometida a imortalidade, nem a nós nem aos lírios: apenas temos a graça de existir durante um extraordinário momento, do berço à sepultura, até à hora em que o fim nos alcança.


Manguel, Alberto. Aquiles e a tartaruga lusitana. E-Revista Expresso, Semanário#2523, 5 de fevereiro de 2021. Tradução de Madalena Alfaia. Ilustrações de Mónica Damas.



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