Primavera

 




Cada coisa a seu tempo tem seu tempo.

Cada coisa a seu tempo tem seu tempo.

Não florescem no Inverno os arvoredos,

Nem pela Primavera

Têm branco frio os campos.

 

À noite, que entra, não pertence, Lídia,

O mesmo ardor que o dia nos pedia.

Com mais sossego amemos

A nossa incerta vida.

 

À lareira, cansados não da obra

Mas porque a hora é a hora dos cansaços,

Não puxemos a voz

Acima de um segredo,

 

E casuais, interrompidas sejam

Nossas palavras de reminiscência

(Não para mais nos serve

A negra ida do sol).

 

Pouco a pouco o passado recordemos

E as histórias contadas no passado

Agora duas vezes

Histórias, que nos falem

 

Das flores que na nossa infância ida

Com outra consciência nós colhíamos

E sob uma outra espécie

De olhar lançado ao mundo.

 

E assim, Lídia, à lareira, como estando,

Deuses lares, ali na eternidade

Como quem compõe roupas

O outrora compúnhamos

 

Nesse desassossego que o descanso

Nos traz às vidas quando só pensamos

Naquilo que já fomos,

E há só noite lá fora.

30-7-1914

Odes de Ricardo Reis . Fernando Pessoa. (Notas de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1946 (imp.1994). 

 - 38.







Floresce em ti, ó magna terra, em cores

Floresce em ti, ó magna terra, em cores

A vária primavera, e o verão vasto,

        E os campos são de alegres.

Mas dorme em cada campo o outono dele

O inverno cresce com as folhas verdes

        Tudo será esquecido.

9-10-1927

Poemas de Ricardo Reis. Fernando Pessoa. (Edição Crítica de Luiz Fagundes Duarte.) Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1994. 

 - 123.

 


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